O cancro é, possivelmente, a doença que mais assusta as pessoas. E se atualmente o número de casos desta doença é elevadíssimo, estimativas recentes apontam para que o cenário se torne pior nos próximos anos. Na realidade, pensa-se que dentro de alguns anos, uma em cada duas pessoas possa sofrer de algum tipo de problema oncológico durante a sua vida! Apesar de todo o investimento na descoberta de possíveis tratamentos e curas, o que é certo é que ainda estamos longe de poder afirmar que o problema se encontra controlado. Isto não significa, como é óbvio, que não tenham sido feitos avanços notáveis a este nível, mas sim que ainda há um longo caminho pela frente. Sendo o cancro uma doença que fragiliza fisicamente e psicologicamente não apenas a pessoa que tem a doença, mas todos os que a rodeiam, é normal que por vezes a ansiedade e o desespero para se obter soluções que, em muitos casos, não existem, levem as pessoas a procurar alternativas aos tratamentos convencionais – quimioterapia e/ou radioterapia. E neste contexto em particular, as chamadas “medicinas alternativas” têm vindo a ganhar cada vez mais adeptos…
Quando se fala em tentar “curas” alternativas para o cancro, há uma que é extremamente frequente, que é através da alimentação. Antes de continuar este texto, gostaria de deixar bem clara a minha posição sobre este assunto: Nenhum alimento tem potencial para curar o cancro. A alimentação tem um papel fundamental na prevenção do cancro, e no prognóstico do cancro, mas nunca deve ser encarada como algo que cura o próprio cancro!!!! Voltando às chamadas medicinas alternativas, é frequente quem tem cancro optar por suplementos alimentares, feitos na maior parte das vezes com plantas e especiarias. Neste contexto, uma das palavras mais utilizada é “antioxidante”. De uma maneira geral, os antioxidantes são substâncias que protegem as nossas células de potenciais danos a que estão expostas diariamente. Ou sejam têm uma função protetora, potencialmente benéfica. Mas será que isso significa que o ideal é consumir o máximo de antioxidantes possível, principalmente num contexto de cancro?
Devido ao seu efeito potencialmente protetor, os antioxidantes têm vindo a ser cada vez mais consumidos em casos de cancro.
Recentemente foi publicado um artigo na revista American Journal of Clinical Nutrition, no qual se procurou perceber qual o impacto do consumo de suplementos de antioxidantes durante tratamentos de quimioterapia e/ou radioterapia em pacientes com cancro da mama. Os resultados obtidos revelaram que, de uma maneira geral, esse consumo aumentou o risco de mortalidade e de reaparecimento do cancro.
Acredito que os resultados deste estudo possam ser chocantes para muitos. Na realidade, estamos habituados a associar o consumo de antioxidantes a proteção, ou seja, a potenciais benefícios para a nossa saúde. Este estudo mostra que, durante os tratamentos do cancro, o consumo de suplementos de antioxidantes não só não tem efeito protetor, como parece ter exatamente o efeito contrário. Há algumas considerações que merecem ser feitas em relação a estes dados. Em primeiro lugar, os tratamentos de radioterapia e quimioterapia são tratamentos destrutivos, que têm como objetivo eliminar o maior número possível de células de cancro. Ao consumirmos um suplemento de antioxidantes, vamos dar a todas as células do nosso corpo (incluindo as do cancro), defesas adicionais contra esse tipo de tratamentos. Devido a isso, é normal que os mesmos possam perder eficácia. Em segundo lugar, os resultados obtidos dizem respeito ao consumo de suplementos de antioxidantes, e não de alimentos contendo antioxidantes. Há cada vez mais evidências que demonstram que o contexto alimentar de vários nutrientes e compostos bioativos parece ser determinante para os seus efeitos. Ou seja, pode não ser a mesma coisa obter vitamina C a partir de uma laranja ou a partir de um comprimido, por exemplo. Além disso, as doses de antioxidantes nos suplementos são tradicionalmente elevadas, atingindo valores que muitas vezes seriam muito difíceis de atingir com a alimentação. Portanto, este estudo não vem defender que a alimentação deve ser pobre em antioxidantes, mas sim que a utilização de potenciais suplementos deve ser sempre devidamente equacionada por um nutricionista, ou outro profissional devidamente qualificado. Quanto à alimentação, deve ser equilibrada, diversificada e (muito) nutritiva, tal como acontece em todos os períodos da nossa vida!
O consumo de suplementos de antioxidantes durante tratamentos de radioterapia e/ou quimioterapia parece aumentar o risco de mortalidade e de reaparecimento do cancro.